Alternativas naturais para infecção urinária

As infecções do trato urinário (ITUs) afetam mundialmente mais de 150 milhões de pessoas. Dados apontam que aproximadamente 40% das mulheres e 12% dos homens experimentam pelo menos uma ITU sintomática durante a vida. Entre as mulheres, cerca de 25% sofrem de ITU recorrente, que é definida pela ocorrência de pelo menos 3 episódios de infecção do trato urinário nos últimos 12 meses ou 2 episódios nos últimos 6 meses.

Os tratamentos para infecção urinária, geralmente, são realizados com antibióticos. Porém, existem ativos e nutrientes que podem auxiliar nesse processo, bem como evitar possíveis reinfecções.

Infecção do Trato Urinário (ITU)

A bactéria gram-negativa Escherichia coli (E.coli) é o agente causal de 80 a 85% das ITUs agudas e não complicadas. Acredita-se que esse microrganismo consiga ascender pela uretra e chegar até a bexiga. O mesmo se adere às células do epitélio urinário através das fímbrias (“braços”) e produz danos nos tecidos, caracterizando a infecção. Sua entrada no trato urogenital se dá a partir do intestino por via fecal-perineal-uretral.

Conforme mencionado, por questões anatômicas, as ITUs são mais comuns em mulheres, especialmente nas sexualmente ativas, com alterações da microbiota ou com condições específicas como diabetes. Além disso, o processo da menopausa leva à diminuição dos níveis de estrogênio, o que aumenta a probabilidade de ITUs devido a alterações na flora bacteriana vaginal.

A forma mais comum da infecção é a cistite, um tipo esporádico e não complicado que acontece em indivíduos saudáveis. Os sintomas geralmente incluem disúria, maior frequência e urgência urinária, dor suprapúbica, possível hematúria e urina turva com odor desagradável.

Tratamento das ITUs

O tratamento das ITUs se dá pelo uso de antibióticos. Entretanto, indivíduos com ITU recorrente muitas vezes necessitam do uso frequente desse tipo de medicamento em curtos períodos de tempo. Esse fato leva ao aumento do risco de desenvolvimento de resistência bacteriana aos antibióticos. Por exemplo, as taxas de resistência às fluoroquinolonas podem ser superiores a 20%. Por isso, métodos não antibióticos para prevenção e tratamento adjuvante são de interesse na área da saúde, especialmente nos casos não complicados da doença.

Aderência da bactéria uropatogênica E. coli nas células epiteliais da bexiga.
As fímbrias tipo I e II permitem sua adesão ao tecido, onde há multiplicação e produção de toxinas, caracterizando a ITU.

Protoantocianidinas do cranberry

O cranberry (Vaccinium macrocarpon Ait.) é frequentemente usado para prevenir ITUs. Esse alimento é rico em proantocianidinas do tipo A (PACs A), que são capazes de se ligar às fímbrias bacterianas no trato urinário, evitando ou diminuindo a infecção, uma vez que impede que o microrganismo consiga aderir ao epitélio. Essa ação, inclusive, parece ter efeito dose-dependente.

As PACs A são incomuns, visto que geralmente os alimentos ricos em taninos possuem grandes quantidades de PACs do tipo B. Essas últimas não demonstraram efeitos satisfatórios nas ITUs, segundo um estudo que observou o efeito do suco de cranberry em comparação ao suco de maçã, de uva roxa, ao chá verde e ao chocolate amargo, ricos em PACs B. Ao contrário do cranberry, rico em PACs A, os alimentos ricos nas proantocianidinas do tipo B não foram efetivos em impedir a adesão da E. coli no trato urinário.

Essa atuação como análogos de receptores embasa a profilaxia e tratamento com esse nutriente. Uma pesquisa verificou atividade antiaderência significativa na urina de voluntários que consumiram cranberry em pó em comparação aos que consumiram placebo (p<0,001), sendo o efeito dependente da dose: o índice de adesão (IA) de bactérias cultivadas em amostras de urina coletadas após consumo de cranberry com 36 ou 72mg de PACs A foi significativamente menor do que o IA após a dose com 18mg de PACs A (p<0,001).

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Microscopia de fluorescência da cepa E. coli gfp+ cultivada em urinas de voluntários coletadas após consumo de cranberry em pó e carregadas em células epiteliais T24 . A. E. coli cultivada em urina coletada após consumo de placebo; B. E. coli cultivada em urina coletada 6 horas após o consumo de cranberry em pó contendo 18mg de proantocianidinas (PAC); C. E. coli cultivada em urina coletada 6 horas após o consumo de cranberry em pó contendo 36mg de PAC; D. E. coli cultivada em urina coletada 6 horas após o consumo de cranberry em pó contendo 72mg de PAC (Howell et al., 2005).

D-manose

Outra substância que se mostra efetiva no tratamento ou prevenção de ITUs é a D-manose. Classificada como um monossacarídeo e produzida naturalmente pelo corpo a partir da glicose, a D-manose está presente nas células e em alguns alimentos, como o próprio cranberry. Uma particularidade é que esse carboidrato não é metabolizado pelo organismo nem armazenado nos órgãos, mas sim excretado pela urina, chegando inalterado em trato urinário cerca de 1 hora após a ingestão.

Assim como as PACs A, a D-manose bloqueia a adesão das bactérias às células uroteliais. Estipula-se que ela possua uma estrutura semelhante ao local de ligação, atuando como um análogo de receptor, de modo que uma concentração suficientemente alta desse nutriente pode causar saturação de adesinas bacterianas e impedir que elas se liguem ao trato urinário.

Como o processo de adesão bacteriana ao urotélio é determinante para o início da doença, a D-manose parece eficaz no tratamento e prevenção da ITUs, de forma que moléculas semelhantes à manose reduzem a carga bacteriana em até 4 vezes no trato urinário e na bexiga. Após se ligarem ao monossacarídeo, as bactérias são bloqueadas na urina e eliminadas.

Cranberry

Fornece uma classe de flavonoides com potente ação antimicrobiótica: as Proantocianidinas Tipo A (PCAs) e D-Manose

Ligam-se às fímbrias tipo II (resistentes a D-Manose) das bacterias

Evitam que as bactérias “agarrem” no revestimento celular do trato urinário e facilitam a eliminação.

D-Manose

Gliconutriente (carboidrato) compatível com as fímbrias tipo I das bactérias

Quando as bactérias são expostas
a uma grande quantidade de D Manose livre na bexiga, se ligam a estas ao invés da D Manose das células do epitélio urinário

Evita a aderência e,
consequentemente
o início da infecção.

Principais características e propriedades do cranberry e da D-manose nas ITUs.

 

A E.coli contém dois tipos de receptores: fímbrias tipo I que aderem à D-Manose e fímbrias tipo II que se aderem aos PACs do Cranberry.

Atuação da PACs A e da D-manose na fisiopatologia das ITUs.

O que diz a literatura

Densidade de incidência

Um ensaio clínico randomizado, duplo-cego e controlado por placebo verificou os efeitos do consumo de uma bebida de cranberry por 24 semanas na densidade de incidência clínica de ITU em mulheres saudáveis com histórico recente da doença. Observou-se densidade de incidência significativamente menor no grupo experimental, ajustado para uso de antibióticos e tempo suscetível sob observação (razão da taxa de incidência: 0,61; IC 95% 0,41 a 0,91; p = 0,016). Ainda, a densidade de incidência de ITUs sintomáticas com piúria (ajustada para uso de antibióticos) foi significativamente reduzida em comparação com o placebo (taxa de incidência: 0,63; IC 95%: 0,40 a 0,97; p = 0,037).

Prevenção de ITUs recorrentes

Outro ensaio clínico randomizado, duplo-cego e controlado por placebo com o objetivo de avaliar a eficácia de um extrato de PACs A em altas doses na prevenção de ITUs recorrentes em mulheres, obteve como resultados que, após 24 semanas, 45 ITUs sintomáticas foram diagnosticadas no grupo de dose alta, em comparação com 59 no grupo de dose baixa. Ainda, a taxa de incidência de ITU sintomática no grupo experimental foi de 1,48 (IC 95%: 1,11 a 1,99) em comparação com 1,96 (IC 95%: 1,52 a 2,53) no grupo controle. Por fim, em mulheres com menos de 5 ITUs nos 12 meses anteriores à inscrição, a ingestão diária de 2 x 18,5mg de PAC em comparação com 2 x 1mg de PAC foi associada a uma redução estatisticamente significativa de 47% na taxa de incidência ajustada por idade de ITU sintomática com piúria (TIR = 0,54, IC 95%: 0,30 a 0,99).

Redução da persistência de cistite

Um estudo realizado com mulheres sobreviventes do câncer de mama verificou a ação da suplementação de N-acetilcisteína + d-manose + Morinda citrifolia associada à terapia com antibiótico na redução da persistência de cistite. Após dois meses, o grupo experimental apresentou 87,5% de redução de pacientes com urocultura positiva, enquanto o grupo placebo, tratado apenas com antibióticos, obteve redução de 10%. Além disso, as pacientes do grupo placebo que apresentaram urocultura negativa no meio do estudo positivaram ao final dele, o que não aconteceu no grupo experimental. Os autores observaram que o suplemento foi eficaz em reduzir bacteriúria, cistite recorrente e outros sintomas urinários.

Distribuição do desconforto experimentado nos cinco domínios urológicos investigados nos pacientes do Grupo 1 (Antibiótico associado no NDM) e Grupo 2 (Antibiótico apenas) antes e após o tratamento e na 1ª e na 2ª consulta, respectivamente.

Ação dos probióticos nas ITUs

Os probióticos, como os Lactobacillus, também têm seu papel para restaurar o equilíbrio da flora intestinal após tratamentos com antibióticos ou desequilíbrios imunológicos, além de se mostrarem benéficos para a flora vaginal, sendo usados na prevenção e auxílio no tratamento de vaginoses bacterianas.

Nesse sentido, uma pesquisa com 55 mulheres com ITU observou os efeitos, pós-tratamento com antibióticos, da suplementação de probióticos (Lactobacillus paracasei) + cranberry + D-manose durante os 10 primeiros dias de 3 meses (Grupo 1) ou uma vez por dia durante 90 dias (Grupo 2) ou nenhum tratamento (Grupo 3). 87,7% dos pacientes do Grupo 1 permaneceram livres de ITU até o dia 90 e 65,8% não foram diagnosticados no dia 150. No Grupo 2, 84,9% estavam livres de ITU no dia 90 e 68,8% no dia 150, enquanto no Grupo 3 (controle) 42% no dia 90 e 36,9% no dia 150 estavam livres de ITU.

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Em conclusão, algumas revisões e metanálises já avaliaram os efeitos do cranberry e da D-manose na prevenção ou no tratamento das ITUs. Apesar da pequena quantidade de ensaios clínicos randomizados e da heterogeneidade entre as pesquisas, boa parte delas aponta um efeito benéfico dessas substâncias, isoladamente, em conjunto ou em adição de outros nutrientes, como terapia preventiva, terapêutica ou adjacente nos casos de ITUs recorrentes, especialmente em mulheres.

Um dos produtos que contempla na composição substâncias naturais que podem auxiliar em tratamentos para infecção urinária é o Cranberry Lift. Sua fórmula traz a combinação do Cranberry americano, fonte de proantocianidinas tipo A (PACs-A), com a D-manose.

 

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